domingo, 12 de outubro de 2014

Espirais


Quando eu tinha uns 6 anos, teve uma sessão de fotos na escola. Os profissionais vestiam as crianças de princesas e príncipes, nos montavam de um jeito engraçado e faziam caretas pra gente mostrar os dentes. Meu cabelo era curto na época. Lembro que minha mãe viu as fotos 3X4 (aquelas que eles mandam pros pais escolherem) e exigiu que tirassem outra foto minha por que meu cabelo ficou muito armado naquela. Foi a primeira vez que eu tinha ouvido aquela palavra. Desde então não me lembro de sair de casa com o cabelo solto.

Não foi culpa da minha mãe. A gente sabe que é uma cultura imbecil que foi criada e colada nas paredes da sociedade. Ela não fez por mal, e nem pensa o que pensa por mal. Ela não diz que fulana tem o cabelo ruim por maldade, ela fala por que é assim que ela cresceu ouvindo. Minha mãe tem cabelo cacheado, lindo e bem cuidado. Mas ela não sabe. Ela ainda pensa em fazer progressiva. Não é preconceito dela, é assim que as coisas são, ou melhor, eram.

Eu passei minha adolescência inteira aprendendo todos os tipos de tranças que ensinavam em tutorias do youtube, passava dez minutos alisando a franja e mais cinco pra elaborar qualquer trança que prendesse o meu cabelo cheio. Não ficava feio não. Mas era um tipo de prisão, sabe? Todos os dias da minha vida eu acordava pensando no que fazer pra dar jeito na juba, e por mais que eu me esforçasse, não me sentia bonita.

Graças a Deus minha querida mãe sempre teve um pouco de medo de quimica, e mesmo que eu suplicasse pra ela me deixar alisar definitivamente a resposta era um sonoro não. Lá pelos meus 14 anos ela resolveu testar o relaxamento no meu cabelo. Desestruturou o cacho, ficou esticado e ressecado, com uma franja lisa e o comprimento esquisito. Esperei uns dois anos e meio pra toda a quimica sair do meu cabelo e tentei com outro profissional. Foi mas leve, suavizou o volume. Porém, eu continuava com a mesma rotina de sempre: trança/coque/rabo de cavalo.

No meio do ano passado, meu cabelo estava na altura da cintura, totalmente natural. Mas eu ainda tinha os meus traumas em relação à ele, não sabia cuidar direito, não aceitava o volume e tinha aquela velha ideia na cabeça: cabelo cacheado é lindo, mas não combina comigo.

Tomei um baque sentimental nessa época, coisa ligada ao coração. Senti que precisava me livrar daquele corpo e assumir uma nova identidade pra me libertar do que tinha acontecido. Uma amiga aconselhou que eu cortasse, e lá fui eu, com uma foto da Leticia Sabatella no salão. Saí aos prantos. Era o dobro do volume. Era o meu rosto em evidencia. Era tudo demais de uma vez só. Fiz selamento no meio de um ataque de pânico. Ficou esticado, meio liso meio cacheado. Um horror.

Comecei a buscar soluções na internet. E foi aí, no alto dos meus 20 anos que descobri um mundo de meninas com o cabelo crespo que se sentiam exatamente como eu me sentia. Conheci Suzane Camila, que me apresentou a santa fitagem, e conheci a Rayza Nicacio que me convenceu que eu sou linda assim desse jeitinho que Deus me fez. E conheci mais uma pancada de garotas lindas e confiantes que me inspiravam ( e inspiram) todos os dias.

Essas pessoas, aliadas com Deus, fizeram uma revolução na minha vida. Pode parecer questão de estética olhando de fora. Pode parecer bobagem ficar chateada com comentários do tipo: Ah, faz chapinha, você fica bem de cabelo liso. Mas só quem entende como é ruim ter o seu cabelo puxado por quase 1 hora e meia tentando deixar ele lisinho e ficar dois dias pra tirar o ressecamento que a temperatura deixa nos fios sabe como é maravilhoso e difícil aceitar os cachinhos soltos e indiscretos. Eu me acho muito bonita quando faço escova, combina com tudo e chama menos a atenção. Mas é muito sofrimento sabe, não vale a pena. Além do que eu olho no espelho e vejo que aquela não sou eu. Sei que ainda vai ter muita gente tentando me convencer do contrário, só que essa é uma energia vem de dentro pra fora. Eu aprendi a me amar com todas as cicatrizes que a vida me fez, aprendi a gostar da minha pele sem cor definida, aprendi a entender as minhas crises de carência, e aprendi a amar o meu cabelo cacheado, volumoso e nada convencional.

E sabe de uma coisa? Eu tô bem feliz.

6 comentários:

  1. Que linda história Débora !!! adorei.... existem muitas pessoas que possuem um pouquinho desta trajetória de aceitação. Mais você está certíssima, seja feliz como você é ou como queira, nunca se deixe levar pelo que os outros desejam ou pensem a sua maneira certa de agir. Parabéns!! e CACHEIA menina,kkkkkkkkkkk..... bjs e abraços!!!

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  2. acho q sei quem é a amiga dque te deu a foto da Letícia Sabatella kkkkkkkkkkk

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